Palavra sumarenta e seca ao mesmo tempo. Palavra dura e terna que vem de compadre e de companheiro. Repito-a quando a solidão espreita, e ela devolve-me a todos os compas que tenho na Costa Rica, na Nicarágua, em El Salvador, em Chiapas, e especialmente a um que vive em Caleta Chica, perto de Talcahuano, no frio Sul do Chile.
Em 1968 baptizámos o seu único filho com água do mar, porque nasceu junto do Pacífico. Na qualidade de padrinho, ofereci-lhe as suaves peles de ovelha que lhe amornaram o berço, e durante a festa devorámos os mariscos que a minha comadre tinha para oferecer, celebrando com muito vinho a cumplicidade que nascia do calor de nos tratarmos por compa.
O meu compa foi sempre homem de poucas palavras. Muitas vezes cheguei a casa dele, a única rodeada de vasos com gerânios, e mesmo que tivessem passado vários meses sem nos vermos, a sua saudação era: Que quer comer, compa? E a minha resposta foi sempre a mesma: Você sabe, compa.
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Deixámos de nos ver durante quinze anos e, quando me deixaram regressar ao Chile em 1989, a primeira coisa que fiz foi partir para Caleta Chica.
A casa continuava igual, os gerânios pareceram-me multiplicados, mas no semblante da minha comadre a tristeza havia deixado as suas marcas. Perguntei-lhe pelo meu afilhado e ela só conseguiu murmurar: O mar levou-o, porque nesse momento apareceu o meu compa.
Abraçámo-nos os três. Estreitámo-nos. Chorámos e, quando tentei dizer qualquer coisa como lamento, o meu compadre agarrou-me pelos ombros e, olhando-me nos olhos, perguntou: Que quer comer, compa?. Você sabe, compa, respondi eu.
Com a gente do Sul do mundo aprendi que a ternura tem que ser protegida com dureza e que a dor não nos pode paralisar. Em 1985, quando uma tempestade lhe arrebatara o seu único filho, o meu compa encontrava-se na clandestinidade, lutando contra a ditadura, e nem sequer pôde assistir ao ritual de se lançarem flores ao mar. Chorou o que havia a chorar muito mais tarde, no fundo marinho, no pequeno universo circular do escafandro de mergulhador.
Vemo-nos de dois em dois anos, mas que importam a distância e o tempo se tenho a certeza de que num certo lugar da costa chilena me espera uma casa rodeada de gerânios e, no meio de tanto lixo universal, a dignidade daqueles que de verdade ganham o pão que comem.
Luís Sepúlveda, in As rosas de Atacama