Quarta-feira, 14 de Abril de 2004

A voz dos resistentes (I)

embarque.jpg

size=2>Menina dos olhos tristes
publicado por lique às 07:40
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Terça-feira, 13 de Abril de 2004

Canções do Niassa

Os poemas aqui transcritos fazem parte duma colectânea no site

Guerra Colonial</font>



e "os autores das letras, que as adaptaram a melodias em voga nessa época, são desconhecidos". Aqui ficam, para que conste.



"SERENATA"

I
Anda vem comigo
Fazer uma serenata
Anda que o ar é fresco
E a lua estiva é prata

II
Homens de rosto duro
Avançam pela picada
Partem de olhar em prumo
Chegam de cara crispada

III
Vieram de camponeses
Outros foram estudantes
Hoje de armas em punho
Tornaram-se assaltantes

IV
Pedidos de helicópteros
Para nunca chegar
Não resta outra sorte
Que o corpo sepultar

V
Os dias depois da chega
De tudo se consumar
Porque ao senhor comandante
Apeteceu passear

VI
Cá ao Norte do Candulo
Onde a fama não se acaba
Já vejo os meus abutres
Mas os gajos não se ralam

VII
Aos grandes ídolos da Nação
Que tenho para te dar
Secaram as minhas fontes
Agora só o cantar.






"POEMA DO MILITANTE"

Mãe,
Eu tenho uma espingarda de ferro!
O teu filho,
Aquele a quem um dia viste acorrentarem
E choraste,
Como se as correntes prendessem e ferissem
As tuas mãos e os teus pés
O teu filho já é livre, Mãe!
O teu filho tem uma espingarda de ferro
A minha espingarda
Vai quebrar todas as correntes,
Vai abrir todas as prisões,
Vai matar todos os tiranos,
Vai restituir a terra ao nosso povo,
Mãe, é belo lutar pela liberdade!
Há uma mensagem de justiça em cada bala
que disparo
Há sonhos antigos que acordam como
pássaros
Nas horas de combate, na frente de batalha,
A tua imagem próxima desce sobre mim.
É por ti também que eu luto, Mãe.
Para que não haja lágrimas nos teus olhos.



(Poema encontrado numa base da Frelimo na zona do Lunho)


publicado por lique às 07:30
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Segunda-feira, 12 de Abril de 2004

Para que ninguém se esqueça (I) - A guerra

guerra1.jpg


"Mortos

Durante os 13 anos de Guerra, e segundo elementos incluidos na Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974), registou-se um total de 8 290 mortos nas três frentes de combate.
O subtotal mais elevado refere-se a Angola (3 258), embora a exiguidade do território leve a ter de se referir a Guiné, com 2 070.
A grande maioria dos que morreram caiu em combate, e aqui o número mais elevado registou-se em Moçambique (1 481); seguem-se Angola (1 306) e Guiné (1 240).


Feridos

O número é dificil de calcular. A Associação de Defecientes das Forças Armadas presta serviços a 13 mil sócios, todos, portanto, portadores de “ deficiência permanente e adquirida durante o serviço militar”. Mais cerca de 3 mil processos aguardam solução. Estimativas apontam para um total de 30 mil deficientes. Não custa aceitar que o número de feridos, com maior ou menor gravidade, é bastante mais elevado, até porque, em muitos caso, os ferimentos não deixaram marcas.
Muitissimo mais alto é o número de afectados, sobretudo a nível psiquico. Médicos têm estudado o fenómeno, calculam em cerca de 140 mil os antigos militares com “stress de guerra”,uma doença mais grave do que se supõe.
Mas há outra ferida que as próprias autoridades procuram esconder o mais possível : os desaparecidos. Recentemente, a Grande Reportagem, escrevendo sobre estes “ heróis sem regresso”, dizia que “ de 1971 a 1973, há no Diário de Notícias nove referências a desaparecidos de combate”. E nos dez anos anteriores ?
Ninguém vai acreditar que não haja números oficiais. Talvez á medida que o tempo passe, sejam criadas as condições para exorcizar definitivamente o fantasma da guerra, de modo a que ninguém fique submergido pela capa do silêncio."



Centro de Documentação 25 de Abril - Universidade de Coimbra


publicado por lique às 17:26
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Domingo, 11 de Abril de 2004

2.o Andar, Direito

lovers.jpg


Ele vinte anos, e ela dezoito
e há cinco dias sem trocarem palavra
lembrando as zangas que um só beijo curava
e esta história começa no instante
em que o homem empurra a porta pesada
e entra no quarto onde a mulher está deitada
a dormir de um sono ligeiro

E no quarto, às cegas,
o escuro abraça-o como que a um companheiro
que se conhece pelo tocar e pelo cheiro
e é o ruído que o chão faz que lhe traz
o gosto ao quarto depois de uma ruptura
faz-lhe sentir que entre os dois algo ainda dura
dos dias em que um beijo bastava

E agora, da cama
vem uma voz que diz sussurrando: És tu?
e a luz acende-se sobre um braço nu
e a mulher pergunta: a que vens agora?
é que não sei se reparaste na hora
deixa dormir quem quer dormir, vai-te embora
amanhã tenho de ir trabalhar.

Não fales, que o bebé ainda acorda
não grites, que o vizinho ainda acorda
e não me olhes, que o amor ainda acorda
deixa-o dormir o nosso amor, um bocadinho mais
deixa-o dormir, que viveu dias tão brutais

E o homem, de pé
Parece um rapazinho a ver se compreende
e grita e diz que ele também não se vende
que quer a paz mas de outra maneira
e nem que essa noite fosse a derradeira
veio afirmar quer ela queira ou não queira
que os dois ainda têm muito a aprender

Se temos...! Diz ela
mas o problema não é só de aprender
é saber a partir daí que fazer
e o homem diz: que queres que responda?
Não estamos no mesmo comprimento de onda...
Tu a mandares-me esse sorriso à Gioconda
e eu com ar de filme americano

Somos tão novos, diz o homem
e agora é a vez de a mulher se impacientar
essa frase já começa a tresandar
é que não é só uma questão de idade
o amor não é o bilhete de identidade
é eu ou tu, seja quem for, ter vontade
de mudar e deixar mudar

Não fales, que o bebé ainda acorda
não grites, que o vizinho ainda acorda
e não me olhes, que o amor ainda acorda
deixa-o dormir o nosso amor, um bocadinho mais
deixa-o dormir, que viveu dias tão brutais

E assim se ouviu
pela noite fora os dois amantes falar
e o que não vi só tive de imaginar
é preciso explicar que sou o vizinho
e à noite vivo neste quarto sozinho
corpo cansado e cabeça em desalinho
e o prédio inteiro nos meus ouvidos

Veio a manhã e diziam
telefona ao teu patrão, diz que hoje não vais
que viveste uns dias assim tão brutais
e que precisas de convalescença
sei lá, inventa qualquer coisa, uma doença
mete um atestado ou pede licença
sem prazo nem vencimento, se preciso for
(espero que não seja preciso, porque não
sei como é que eles vão viver sem os
dois salários...)

Vá fala que o bebé está acordado
e vizinho deve estar já acordado
e o amor, pronto, também está acordado
mas tem cuidado, trata-o bem
muito bem, de mansinho
que ainda agora vai pisar outro caminho.


size=2>Sérgio Godinho
size=1>Quadro - Hegina Rodrigues

Origem da imagem




size=2>Porque me apeteceu recordar...
publicado por lique às 23:05
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Sexta-feira, 9 de Abril de 2004

Uma voz de Angola - um cheirinho de Pepetela

linhas.jpg


“Mas diga uma coisa, camarada escritor ou jornalista ou o quê...Jornalista não é de certeza, você garantiu. Se fosse, não lhe falava, não posso com jornalistas, já vai saber porquê... Ganha quanto por mês? Depende dos livros que vende, afinal? Isso dá para viver? As pessoas compram muito? Devem comprar, agora compra-se tudo antes e só depois é que se vê o que está a sair na bicha. Disco dá, tenho um amigo cantor tem kumbu bué. Nos tempos que se fazia disco aqui. Mas livro como é? À rasca então? E não tem esquema prá carne, pró peixe, etc.? Não? Como pode então? Não sei mesmo como vive, mas o problema é seu. Mesmo com dinheiro a vida é uma puíta...
Eu cá não é de dinheiro que me governo, não. Sabe como é aí nas fábricas. Grande conquista da Revolução! O que nós produzimos, a nossa gloriosa classe operária que tenho orgulho de pertencer, o que produzimos é que nos safa. No tempo do colono não era assim, távamos mesmo lixados, era a exploração capitalista. Agora não é nada o salário, esse é melhor esquecer. Mas as latitas que cada um tem direito por dia e mais aquelas que cada um faz sair mesmo sem ter direito, essas é que dão. Vou com uma lata ao talho e troco por meio quilo de carne. Vou com uma lata à padaria e troco com o pão que quiser. Assim...Pró dinheiro, entrego umas latitas à mulher que as vai vender no bairro. No mercado agora está difíciil, tem fiscais. Eles têm medo, fingem não vêem, mas com esses deles nunca se sabe. Um dia podem armar em vivos e dá maka."


Pepetela, O cão e os caluandas








“Então não havia o Afeganistão, a Somália, o Irão ou a Colômbia, países ideais para um americano morrer de morte matada, sem levantar muitas comoções nem pasmos, pois eram territórios já habituados a serem tratados de promotores e antros de horripilantes antiamericanismos? Aí tanto fazia, mais um menos um, não provocava qualquer crise mundial.
Porque iria logo escolher a pacífica Benguela, onde, de memória de gente, nunca nenhum americano tinha morrido, nem mesmo quando os ianques andaram a apoiar, abertamente ou de caxexe, os famigerados "terroristas", linguagem oficial de um dos lados, "lídimos e heróicos defensores da democracia" no dizer do outro lado?”

Pepetela, Jaime Bunda e a morte do americano




Pepetela (Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos), nasceu em Benguela, em 1941. Licenciado em Sociologia, escritor, guerrilheiro, político, é hoje professor na Universidade Agostinho Neto, em Angola.

publicado por lique às 22:37
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