Sexta-feira, 30 de Abril de 2004
Se eu quisesse comentar aquilo em que, nos dias de hoje, se tornou o dia 1º de Maio e as comemorações a ele associadas, faria aqui outra transcrição de Milan Kundera sobre a Grande Marcha e o kitsch de esquerda. Ficará para outro dia
Hoje prefiro lembrar o 1º de Maio de há 30 anos. Explosão de uma alegria que não cabia no peito, canções revolucionárias, bandeiras vermelhas, punhos cerrados ou dedos em V, cravos nas mãos de toda a gente, braços estendidos para tocar os militares que passavam, sentimentos múltiplos à flor da pele! Eu estive lá, naquela Avenida Almirante Reis pavimentada de gente, e ainda hoje digo que foi o único dia de alegria sem mancha da minha vida. Pura alegria, pura exaltação! O 25 de Abril foi diferente. Emocionado, angustiado. Mas aquele 1º de Maio, o primeiro e o último dia em que todos tivemos a mesma voz, nunca o hei-de esquecer.
Eu era jovem e sem pressentimentos de mau agouro. O futuro havia de ser sempre assim. Mas quero deixar aqui as palavras de alguém que, com a sabedoria da idade, teve a premonição do futuro:
Coimbra, 1 de Maio de 1974 . Colossal cortejo pelas ruas da cidade. Uma explosão gregária de alegria indutiva a desfilar diante das forças da repressão remetidas aos quartéis.
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Segui o caudal humano, calado, a ouvir vivas e morras, travado por não sei que incerteza, sem poder vibrar com o entusiasmo que me rodeava, na recôndita e vã esperança de ser contagiado. Há horas que são de todos. Porque não havia aquela de ser também minha? Mas não. Dentro de mim ressoava apenas uma pergunta: em que oceano de bom senso iria desaguar aquele delírio? Que oculta e avisada abnegação estaria pronta para guiar no caminho da história a cegueira daquela confiança?
A velhice é isto: ou se chora sem motivo, ou os olhos ficam secos de lucidez
Miguel Torga, in "Diário XII"
De Anónimo a 2 de Maio de 2004 às 18:54
João: Foi um sonho lindo que não conseguimos concretizar. Também não sei se seria possível manter aquele estado de exaltação e unidade. Podíamos era ter cumprido muito mais aquilo que esperámos do 25 de Abril e não ter chegado a este estado de coisas. Mas temos que andar para a frente, tentando que haja mais justiça e solidariedade, o que já não seria mau. Obrigada por teres aparecido. Irei visitar-te logo que possa.lique
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De Anónimo a 2 de Maio de 2004 às 18:02
Eu também lá estive! Foi algo que a geração actual, apenas, vislumbra, pelo muito que se reportou e de que há registo, felizmente, mas que se pretende esquecer..."É coisa do passado"..."vamos esquecer a Revolução"..."vamos pensar em evolução"...Pra mim foi um momento magnífico de solidariedade, de pensamentos comuns, de esperança, enfim...foi um sonho lindo que se desvaneceu...joao465
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De Anónimo a 1 de Maio de 2004 às 12:51
MJM: O teu belo texto reconhece uma verdade essencial: não basta falar do desencanto, é necessário tentar sair desta inércia que permite todas as injustiças. Leva o cravo e usa-o que já chegámos a um tempo em que cravos vermelhos são armas de subversão! Beijinhoslique
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De Anónimo a 1 de Maio de 2004 às 12:43
Não cumpre missão reconher-se o desencanto, apenas, nem q para isso nos ajude a temperança do branco dos cabelos na alma. O marasma invade os ânimos e cobre o mar do entuasiasmo, outrora vivo e vermelho. As foices de quem desbrava, foram destruidas pelos martelos do consumismo. Roubei-te um cravo de lá de cima, que também no meu jardim as rosas de Maio não floresceram. Ks da babyMJM
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De Anónimo a 1 de Maio de 2004 às 12:25
Encandescente: será provavelmente necessário reconstruirmo-nos todos para sairmos desta espiral de materialismo e de gestos que repetimos sem sequer pensar no que significam. Eu também acredito que reconstruir o homem é o caminho para mudar muita coisa errada neste mundo. Beijinhos. Tem um bom 1º de Maio!lique
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De Anónimo a 1 de Maio de 2004 às 12:16
reli hoje "o operário em construção" do vinicius. e agora leio o teu texto. hoje celebra-se, homenageia-se o homem que trabalha, hoje em que cada vez mais só se olham "as coisas" e se esquece quem as fez ou criou. acho que é preciso reconstruir a pessoa.um bom 1º de maio lique. um beijoencandescente
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De Anónimo a 1 de Maio de 2004 às 10:04
Ema: é verdade que é dentro da democracia que temos que encontrar a saída deste beco onde estamos encurralados. E também é um facto que o direito de comemorar este dia em plena liberdade, um dia que durantes anos foi motivo de perseguições, é uma bela conquista. Só por isso e pelo significado do dia, tem um bom 1º de Maio, Ema! E agora vou ver se ainda consigo distribuir aos amigos os cravos que o VermelhoVivo me deu! Beijinhoslique
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De Anónimo a 1 de Maio de 2004 às 09:52
Vermelho Vivo: eu aceito e agradeço o ramo de cravos que distribuo já aqui pelos amigos, mas não aceito o convite. Sabes que tentei durante muitos anos, mas às tantas, tudo aquilo me parecia repetido e vazio de sentido. Como o José, vou fazer a minha comemoração particular. E estou à espera da tua opinião sobre o que disse o Miguel Torga, aqui ou noutro lado. Tem um óptimo dia 1º de Maio. Bjslique
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De Anónimo a 1 de Maio de 2004 às 09:46
Wind: foi realmente um dia extraordinário, no verdadeiro sentido da palavra, daquilo que dificilmente se repetirá. Mas existiu, nós vivemo-lo e esse previlégio devia levar-nos a fazer algo diferente hoje. :)lique
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De Anónimo a 1 de Maio de 2004 às 09:43
Adesse: olá, gosto de te ver por aqui! Infelizmente, o teu comentário reflecte o que aconteceu à maioria dos que viveram aquele dia. Estamos agora com "os olhos secos de lucidez", mas sinceramente eu gostava de acreditar que essa lucidez pudesse servir para agir com menos ingenuidade mas com a mesma determinação. Volta sempre. Já tenho passado pelo teu espaço mas nunca comentei. Voltarei. :)*lique
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